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Curador diz que produção artística amazônica é menos comprometida com apelos do mercado e mais concentrada nas relações com seu lugar de pertencimento
Em cartaz até setembro no Museu Vale, em Vila Velha, Espírito Santo, a exposição “Amazônia: A Arte” tem o desafio de romper com visões estereotipadas da Amazônia, apostando na diversidade do olhar de 32 artistas da região. Os trabalhos de dois importantes fotógrafos paraenses, Luiz Braga e Miguel Chikaoka, foram escolhidos como uma espécie de “cartão de visitas” da mostra – estão logo na entrada, como que chamando a atenção do público para as peculiaridades e sutilezas da arte amazônica.
Orlando Maneschy, curador da exposição, diz que é exatamente este o desafio: sensibilizar o visitante para que aos poucos vá se acostumando seu olhar de modo a perceber as sutilezas, os encontros e desencontros entre as poéticas propostas, “tal qual ribeirinho quando entra na selva”, na comparação de Maneschy. Por esta razão, os trabalhos de Braga e Chikaoka dividem a sala de entrada do Museu Vale, montada em tom de azul um tanto quanto sombrio, mas com visão impactante para quem chega.
Entre as obras destacadas, está a "floresta" montada por Melissa Barbery. A tecnologia é simples – uma série de luminárias e bolas coloridas – mas o resultado seduz o visitante. A artista criou uma iluminação que vai sendo reduzida ao longo da exposição até que acabem as baterias e a composição literalmente se apague. Outro trabalho interessante é o “Vozes da Selva”, de Alexandre Sequeira. O artista criou um backlight cuja imagem resulta de uma fusão entre velas (simbolizando velório, “morte”) e as chamas de uma queimada ao fundo, em alusão à devastação da floresta.
A exposição conta ainda com as pinturas do acreano Helio Melo, falecido em 2001, e com instalações de Emmanuel Nassar, pintor e escultor paraense, responsável pela formação de várias gerações de artistas na região. Entre elas, um painel feito de dejetos urbanos. Interessante também é o trabalho do escultor maranhense Marcone Moreira, jovem expoente das artes plásticas no norte do Brasil, utiliza em seu trabalho elementos mais orgânicos, restos de madeira com traços da pintura original.
Moreira é conhecido por sua concepção que alia a elegância da arte construtiva com a rudeza de materiais descartados para outros usos. Apesar de ser maranhense, o artista está radicado em Marabá, e sua produção é intimamente vinculada à cidade que escolheu para viver, seja quando os materiais, texturas e cores se encontram fisicamente presentes através do uso de madeiras de barcos, carrocerias de caminhão, portas de ferro ou nylon de sacolas, ou como referência fundamental na produção de pinturas, fotografias ou objetos.

Imaginário coletivo

A Amazônia, longe de ser homogênea, é uma região extremamente complexa e diversificada. Portanto, cumpre um papel importante no imaginário social, na medida em que está definitivamente inscrita como um tema de interesse para cidadãos de todo o mundo.  Mas a memória cristalizada remete para uma visão estereotipada “homogeneizadora” da região, representada por ideias ou conceitos como “natureza”, “floresta”, “atrasada”, “reserva de recursos”, entre outros. Esse imaginário de Amazônia também se manifesta no olhar sobre a produção artística dos amazônidas.
O desafio da exposição “Amazônia, A Arte” é romper com essa visão, mostrando que é impossível construir um olhar único, sistemático e reducionista do artista amazônico.  Por viver em uma região isolada geograficamente e “cobiçada” pelo mundo, eles convivem com peculiaridades que lhes permitem um olhar aguçado e crítico para os problemas locais. Exemplo disso são as obras Quando Todos Calam, da artista plástica Berna Reale, ou os registros dos ianomâmis feitos pela fotografa Claudia Andujar.
Idealizada por Paulo Herkenhoff, a exposição reúne videoarte, fotografia, pintura, arte popular e escultura, e estão dispostas sem divisões estanques. O artista diz que os trabalhos “não são olhares ingênuos, improvisados” e exalta a escolha de Orlando Maneschy como curador. “Como artista e pesquisador, ele apresenta um ponto de vista interno, menos marcado pelas noções de exotismo a que comumente é associada”, afirma.
Para Maneschy, a Amazônia constitui-se em um  "sistema paralelo de arte", "uma produção artística menos comprometida com apelos do mercado e mais concentrada nas relações com seu lugar de pertencimento, sua luminosidade, suas peculiaridades socioculturais". Mas isso não a impede de dialogar e se alimentar daquilo que é produzido em outras regiões do País e até do mundo, observa o curador.

via Agência Estado

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