A proibição dos missionários católicos que evangelizaram os índios no século passado. “Toda a coisa do índio, danças, vestimentas, a própria língua, era considerada como uma influência satânica”, explica Higino Tenório, líder do povo tuyuka. Com a modernização da igreja, o misticismo indígena deixou de ser pecado, e a cultura começa a ser resgatada.
Os tuyukas são um dos vinte e três povos da Cabeça do Cachorro, no noroeste do estado do Amazonas, a região de maior diversidade étnica do Brasil. Partindo da cidade de São Gabriel da Cachoeira, no alto Rio Negro, são três dias e meio de lancha, e 364 curvas no interminável ziquezague do Rio Tiquié até a aldeia Tuyuka de São Pedro, na fronteira com a Colômbia.
Para chegar até lá, é necessário vencer cachoeiras: tudo tem que ser retirado da lancha e embarcado mais pra frente, em trecho mais calmo rio acima.
Um dos ingredientes do ritual é o epadu, o nome indígena da folha de coca. Na aldeia, são cerca de quinhentos pés plantados e colhidos pelos próprios índios. “Branco que plantar isso vai preso, né? Porque ele não usa no ritual, né? Ele estraga a humanidade, né?”, questiona Higino Tenório.
As folhas de epadu são torradas e socadas no pilão. São juntadas a folhas de embaúba, que são queimadas até virar cinza. A mistura é batida, peneirada numa bolsa, que parece um coador de pano. O resultado é um pó mais fino, com propriedades energéticas e anestésicas.
Os índios consomem o pó aos punhados. A boca fica dormente e o sono vai embora – a ideia é justamente ficar acordado durante os dois dias da festa. “A gente vai lembrando o que esqueceu. A gente vai pensando até lembrar tudo. Reaviva a memória.”, conta o benzedor Raimundo Tenório.
É o epadu que abre caminho para a ação do carpi, um alucinógeno feito com a casca de cipó, macerado no pilão, misturado à agua fria, coado, e bebido pelos sábios da aldeia. Um chá amargo, indigesto. Mas, dizem os índios, capaz de revelar espíritos invisíveis. “A gente vê cobras, cobras tudo pintado. A gente vê os triângulos”, conta o índio tuyuka José Barreto Ramos. As visões são reproduzidas nas paredes da grande maloca e passadas também para o rosto e para o corpo.
Ninguém pode comer nada. Apenas epadu. E beber, só carpi e caxiri, a bebida fermentada de mandioca, com teor alcoolico semelhante ao da cerveja. E só pode ser consumido o que os pajés benzerem, inclusive o tabaco e o rapé.
Durante o ritual, o bebê passa de colo em colo, por todas as mulheres da família, como maneira de dizer a ele que será cuidado e acarinhado pela comunidade inteira. Quem dá a benção final é a anciã da aldeia. Apesar de seu nome, Buá, não chorou. Durante os dois dias de seu longo batizado, apenas dormiu e mamou enquanto o povo celebrava sua chegada.
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