Live from Copenhaga 2009
Cop 15 Webcast
A senadora Marina Silva entende que o consórcio Norte Energia, responsável pela obra da hidrelétrica de Belo Monte, usou uma "manobra" para driblar as exigências ambientais e conseguir a licença do Ibama e construir um canteiro. "O tempo todo fica esse fantasma da pressão política em cima dos gestores", lamenta. Para ela, há uma "anomalia" no órgão responsável por fiscalizar as normas ambientais. O Ibama, diz, está cedendo às pressões do Ministério de Minas e Energia, que cobra celeridade na construção.
Nesta quarta-feira (26), o Ibama anunciou a concessão de uma licença parcial, que dá direito à execução de parte das obras da usina no rio Xingu, em Altamira (PA). O Ministério Público Federal irá abrir um processo contra a licença, que entende como ilegal, uma vez que o recurso de licenças parciais não é previsto em lei para casos como esse. Além disso, a permissão estava ligada a uma série de condicionantes, como a criação de postos de saúde e poços de água para atender à população local. O promotor federal em Altamira, Bruno Gütschow, esteve em vistorias na região e confirmou à Terra Magazine que a maior parte dessas obrigações não foi cumprida.
Marina vê as condições impostas ao consórcio como indispensáveis. "O que não pode é usar isso como uma manobra para conseguir a licença e depois passar por cima das regras que você mesmo identificou como necessárias", ataca. "Ninguém faz uma cirurgia cardíaca quando o paciente não tem condições de fazê-la apenas por pressão política".
A senadora reclama ainda da ausência de planos que contemplem formas de geração de energia limpa e com baixo impacto ambiental. A urgência de construir Belo Monte para atender à demanda por energia, diz, não se explica. "Se sempre dependermos de uma obra para o País não ir à bancarrota, vamos ficar reféns da nossa própria incapacidade de ter um plano adequado para enfrentar o problema da infraestrutura no Brasil".
Leia a entrevista na íntegra.
Terra Magazine - Qual a sua opinião sobre essa licença parcial concedida pelo Ibama?
Marina Silva - O problema é que as condicionantes não foram cumpridas. Se existe a licença prévia mediante uma série de condicionantes para as etapas seguintes, essas condicionantes deveriam ter sido cumpridas de acordo com as fases, até chegar na licença de operação. O Ministério Público e a sociedade têm razão. Como se já não bastasse o empreendimento não ter resolvido os aspectos da viabilidade ambiental e da viabilidade social - porque vai ter um impacto social que não está resolvido. E também não foi resolvida a questão da viabilidade econômica, porque hoje esse é praticamente um empreendimento só com investimento público. Os investidores privados se ausentaram do processo. Além disso, você ainda tem um processo em que as licenças vêm sendo dadas de uma forma que não passa segurança jurídica. Não passa segurança do ponto de vista do processo técnico. O tempo todo fica esse fantasma da pressão política em cima dos gestores.
É um recurso comum? Não é uma forma de a autoridade ambiental ignorar a lei e ceder à pressão política?
O caso dessa licença prévia de instalação parcial está se tornando algo recorrente. Foi assim com relação a pelo menos três investimentos, contando com esse agora. Foi o caso de Angra 3, das hidrelétricas Santo Antônio e Jirau, do Madeira. E agora Belo Monte. São três casos, cada um com complexidade maior do que o outro. Neste caso houve toda a questão política, do afastamento do presidente e o fato de a licença ter sido assinada pelo interino, mas no passado já havia sido assim. Lamentavelmente, é uma forma de ignorar as condicionantes.
A senhora falou dos impactos ambientais e sociais. Essa lógica de criar condicionantes é suficiente para equilibrar os interesses de geração de energia e os interesses de preservação ambiental?
Elas resolvem ao serem atendidas. O problema da viabilidade social, ambiental e econômica é o que a lei prevê. O que não pode é usar isso como uma manobra para conseguir a licença e depois passar por cima das regras que você mesmo identificou como necessárias. Como é que ficam agora os gestores da área de meio ambiente? Eles deram uma licença dizendo "desde que". "Desde que se faça isso, isso...". São 42 "desde que". Como fica se eles não são cumpridos? A natureza não vai se submeter às pressões políticas. A natureza não vai se adaptar a nós, nós é que temos que nos adaptar a ela.
E qual o tamanho desses impactos sociais?
A obra pode causar danos irreversíveis. Ali envolve comunidades indígenas. Nós teremos uma movimentação de mais de 100 mil pessoas que serão agregadas ao empreendimento. Essas condicionantes não são colocadas por caprichos ambientais, elas são colocadas por necessidades reais. Da mesma forma que você tem que dar conta da viabilidade técnica, você tem que dar conta da viabilidade ambiental. Ela não pode ser minimizada em função das reais necessidades econômicas. Aliás, você tem que resolver as duas coisas. Mas pra resolver as duas coisas, já está mais do que provado que não podemos ficar à mercê de cada empreendimento. Se dependermos de uma obra para o País não ir à bancarrota, vamos ficar reféns da nossa própria incapacidade de ter um plano adequado para enfrentar o problema da infraestrutura no Brasil.
Num processo que vem tramitando há mais de 20 anos, novamente se repetiu o erro histórico que é querer passar por cima dos problemas no lugar de resolvê-los.
A senhora por várias vezes já falou da importância de o Ibama ter a sua autoridade mantida. Desta vez, o Ibama está perdendo força?
Eu sei que os técnicos do Ibama resistem bravamente, fazendo seus pareceres e colocando suas opiniões. Mas esse mecanismo de decisão política indo para as mãos do presidente do Ibama ou para quem quer que seja leva à uma anomalia. Ninguém faz uma cirurgia cardíaca quando o paciente não tem condições de fazê-la apenas por pressão política. Não existe essa história de tomar decisões políticas para coisas que você não tem como reverter politicamente.
fonte: Terra Magazine
28/01/2011
Nesta quarta-feira (26), o Ibama anunciou a concessão de uma licença parcial, que dá direito à execução de parte das obras da usina no rio Xingu, em Altamira (PA). O Ministério Público Federal irá abrir um processo contra a licença, que entende como ilegal, uma vez que o recurso de licenças parciais não é previsto em lei para casos como esse. Além disso, a permissão estava ligada a uma série de condicionantes, como a criação de postos de saúde e poços de água para atender à população local. O promotor federal em Altamira, Bruno Gütschow, esteve em vistorias na região e confirmou à Terra Magazine que a maior parte dessas obrigações não foi cumprida.
Marina vê as condições impostas ao consórcio como indispensáveis. "O que não pode é usar isso como uma manobra para conseguir a licença e depois passar por cima das regras que você mesmo identificou como necessárias", ataca. "Ninguém faz uma cirurgia cardíaca quando o paciente não tem condições de fazê-la apenas por pressão política".
A senadora reclama ainda da ausência de planos que contemplem formas de geração de energia limpa e com baixo impacto ambiental. A urgência de construir Belo Monte para atender à demanda por energia, diz, não se explica. "Se sempre dependermos de uma obra para o País não ir à bancarrota, vamos ficar reféns da nossa própria incapacidade de ter um plano adequado para enfrentar o problema da infraestrutura no Brasil".
Leia a entrevista na íntegra.
Terra Magazine - Qual a sua opinião sobre essa licença parcial concedida pelo Ibama?
Marina Silva - O problema é que as condicionantes não foram cumpridas. Se existe a licença prévia mediante uma série de condicionantes para as etapas seguintes, essas condicionantes deveriam ter sido cumpridas de acordo com as fases, até chegar na licença de operação. O Ministério Público e a sociedade têm razão. Como se já não bastasse o empreendimento não ter resolvido os aspectos da viabilidade ambiental e da viabilidade social - porque vai ter um impacto social que não está resolvido. E também não foi resolvida a questão da viabilidade econômica, porque hoje esse é praticamente um empreendimento só com investimento público. Os investidores privados se ausentaram do processo. Além disso, você ainda tem um processo em que as licenças vêm sendo dadas de uma forma que não passa segurança jurídica. Não passa segurança do ponto de vista do processo técnico. O tempo todo fica esse fantasma da pressão política em cima dos gestores.
É um recurso comum? Não é uma forma de a autoridade ambiental ignorar a lei e ceder à pressão política?
O caso dessa licença prévia de instalação parcial está se tornando algo recorrente. Foi assim com relação a pelo menos três investimentos, contando com esse agora. Foi o caso de Angra 3, das hidrelétricas Santo Antônio e Jirau, do Madeira. E agora Belo Monte. São três casos, cada um com complexidade maior do que o outro. Neste caso houve toda a questão política, do afastamento do presidente e o fato de a licença ter sido assinada pelo interino, mas no passado já havia sido assim. Lamentavelmente, é uma forma de ignorar as condicionantes.
A senhora falou dos impactos ambientais e sociais. Essa lógica de criar condicionantes é suficiente para equilibrar os interesses de geração de energia e os interesses de preservação ambiental?
Elas resolvem ao serem atendidas. O problema da viabilidade social, ambiental e econômica é o que a lei prevê. O que não pode é usar isso como uma manobra para conseguir a licença e depois passar por cima das regras que você mesmo identificou como necessárias. Como é que ficam agora os gestores da área de meio ambiente? Eles deram uma licença dizendo "desde que". "Desde que se faça isso, isso...". São 42 "desde que". Como fica se eles não são cumpridos? A natureza não vai se submeter às pressões políticas. A natureza não vai se adaptar a nós, nós é que temos que nos adaptar a ela.
E qual o tamanho desses impactos sociais?
A obra pode causar danos irreversíveis. Ali envolve comunidades indígenas. Nós teremos uma movimentação de mais de 100 mil pessoas que serão agregadas ao empreendimento. Essas condicionantes não são colocadas por caprichos ambientais, elas são colocadas por necessidades reais. Da mesma forma que você tem que dar conta da viabilidade técnica, você tem que dar conta da viabilidade ambiental. Ela não pode ser minimizada em função das reais necessidades econômicas. Aliás, você tem que resolver as duas coisas. Mas pra resolver as duas coisas, já está mais do que provado que não podemos ficar à mercê de cada empreendimento. Se dependermos de uma obra para o País não ir à bancarrota, vamos ficar reféns da nossa própria incapacidade de ter um plano adequado para enfrentar o problema da infraestrutura no Brasil.
Num processo que vem tramitando há mais de 20 anos, novamente se repetiu o erro histórico que é querer passar por cima dos problemas no lugar de resolvê-los.
A senhora por várias vezes já falou da importância de o Ibama ter a sua autoridade mantida. Desta vez, o Ibama está perdendo força?
Eu sei que os técnicos do Ibama resistem bravamente, fazendo seus pareceres e colocando suas opiniões. Mas esse mecanismo de decisão política indo para as mãos do presidente do Ibama ou para quem quer que seja leva à uma anomalia. Ninguém faz uma cirurgia cardíaca quando o paciente não tem condições de fazê-la apenas por pressão política. Não existe essa história de tomar decisões políticas para coisas que você não tem como reverter politicamente.
fonte: Terra Magazine
28/01/2011
Publicada por
AMC
à(s)
20:07
Etiquetas:
Belo Monte,
Campanhas e Activismo,
Documentos Integrais,
Entrevistas,
Marina da Silva,
Ocupação da Amazónia,
Polémicas e Conflitos,
Política,
Recursos Naturais
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
0 comentários:
Enviar um comentário